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A Organização das Nações Unidas (ONU) realiza todos os anos, em 22 de março, o Dia Mundial da Água. A data, que foi instituída em 1992, tem como objetivo estimular reflexões e discussões sobre a necessidade de mudanças urgentes para enfrentar problemas diversos que envolvem os bens hídricos no planeta.
Com o tema “Acelerando Mudanças – Seja a mudança que você deseja ver no mundo”, neste ano de 2023, a ONU recorreu à fábula do beija-flor, que tenta apagar um incêndio carregando gotas de água em seu bico. O intuito é inspirar ações que provoquem transformações e soluções para problemas que afetam diretamente a vida de milhões de pessoas. Embora a ideia de cada pessoa assumir sua responsabilidade possa parecer inspiradora, ela é insuficiente para solucionar a complexidade de problemas relacionados às questões hídricas.
A responsabilização individual pelo mau uso e desperdício ignora a dimensão estrutural, em particular do uso exploratório e intensivo das fontes hídricas pelo agronegócio, setor que mais consome água no Brasil. São cerca de 72% do consumo total, segundo o estudo “Água na Agropecuária Brasileira”, publicado em 2020 pela Agência Nacional de Águas (ANA). Os dados apontam ainda que a região Nordeste é a que mais utiliza água para a irrigação, representando cerca de 42% do consumo total. O Sudeste vem em segundo lugar, com 26%, seguido pelo Sul, com 20%.
Entre os cultivos irrigados, os que mais consomem água são os de frutas, grãos e cana-de-açúcar, bem como a pecuária, especialmente para a produção de leite e carne. Na maioria dos casos, os empreendimentos não consideram as condições climáticas e hídricas em suas regiões, o que aumenta o uso da água para multiplicar a produtividade, sem considerar os impactos ambientais e sociais que a prática causa.
Além disso, o acesso à água potável e ao saneamento básico no Brasil ainda é um desafio. Segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), realizado em 2019, apenas 83,3% da população tem acesso à água potável e somente 53,2% têm acesso à coleta de esgoto. No Nordeste, a situação é pior, com apenas 53,4% da população com acesso à água potável e 24,4% tendo acesso à coleta de esgoto.
Nas comunidades rurais, o acesso é ainda mais precário, onde 40,3% da população recebe água potável e apenas 7,4% têm acesso ao saneamento básico. Nesse contexto, é fundamental destacar que água de qualidade e saneamento básico são direitos humanos, conforme a Resolução nº 64.292 da ONU, o Artigo 23 da Constituição Federal Brasileira, e a Lei Federal nº 11.445/2007, entre outros dispositivos legais federais, estaduais e municipais.
Quando fazemos o recorte para o Semiárido brasileiro, é perceptível que ocorreram avanços significativos nas políticas de acesso à água, ocasionadas em grande parte pela mobilização da sociedade civil organizada. Um exemplo disso é o Programa de Cisternas, mobilizado e executado pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), que proporcionou acesso à água para mais de 1 milhão de famílias, provando que as ações em conjunto com o poder público são um caminho para a garantia desse direito.
O presidente do Irpaa, José Moacir dos Santos, ressalta que essa política pública para construção de cisternas “salvou muitas vidas” e que a efetividade do programa se dá pela descentralização dos bens naturais. “Não é preciso um grande reservatório para distribuir água, cada pessoa, com seu pequeno reservatório, pode captar, armazenar e gerenciar a água, sem depender de um sistema maior”. As mulheres, por exemplo, por terem água em casa puderam dedicar mais tempo para outras atividades, inclusive de geração de renda ou conquista de uma nova profissão.
Moacir faz um convite à reflexão: “Que desenvolvimento a gente quer? Mais importante hoje do que pensar se vai economizar água na torneira, ou não, é pensar se esses grandes projetos de desenvolvimento, indústrias e fábricas de alimentos, de fato precisam existir. Teriam outras formas da gente comer, beber, ter nossos bens essenciais sem necessariamente depender desses grandes empreendimentos?”, questiona.
No Vale do São Francisco, por exemplo, segundo Moacir, enquanto uma grande empresa de irrigação concentra 10 mil hectares de terra irrigada e gera um emprego a cada cinco hectares, os pequenos projetos de irrigação e produção apropriada, em três hectares, empregam de quatro a cinco pessoas.
Partindo desta perspectiva, quanto mais descentralizado e apropriado for o uso da água para a agricultura, maior será a inclusão social e a distribuição dos bens naturais, como ensinam as práticas ancestrais dos Povos Originários, das Comunidades Tradicionais de Fundo de Pasto, dos Povos Ribeirinhos e das experiências de Convivência com o Semiárido. Sobretudo, é fundamental garantir qualidade e regularidade de água para o consumo humano e outros usos, a exemplo da produção animal e vegetal, bem como para situações de emergência e conservação ambiental.
Importante ressaltar, também, que a sociedade organizada tem um papel fundamental em exigir e participar da construção de políticas públicas sustentáveis que levem em conta a dimensão estrutural do problema. A descentralização da água e do saneamento é crucial para a preservação do meio ambiente e para melhorar a qualidade de vida, principalmente nas comunidades tradicionais. Portanto, é necessário um esforço conjunto para garantir um futuro sustentável para as próximas gerações.
Texto e foto: Eixo Educação e Comunicação do Irpaa
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